O nível de utilização da capacidade instalada ficou no mais baixo patamar da história dos indicadores da Abiquim, com uso de apenas 59% em agosto de 2023, após ter registrado 62% em julho. Em relação a agosto do ano passado, esse índice recuou nove pontos em relação a agosto do ano passado (68%).
Nos últimos dois meses, julho e agosto de 2023, os principais índices do segmento de produtos químicos de uso industrial registraram resultados negativos, na comparação com os meses anteriores. A produção recuou 1,88% em agosto de 2023, após declínio de 6,11% em julho.
Na comparação com iguais meses do ano passado, a produção declinou 17,45% em julho e de 15,54% em agosto. Vale pontuar que agosto de 2023 teve o pior resultado mensal em termos de produção desde 2007. Por outro lado, as vendas internas tiveram um acréscimo de 2,32% em julho e de 7,97% em agosto, ambas variações sobre os meses anteriores.
Apesar dessa melhora, o patamar médio de vendas do bimestre julho-agosto de 2023, a exemplo do que se verificou com a produção, foi o pior desde 2007. Ou seja, a alta recente não compensou as fortes quedas de vendas dos meses anteriores.
O volume de importações teve recuo de 8,8% em agosto, após uma forte elevação de 31,1% em julho de 2023, na comparação mensal. Com esses resultados, a demanda interna, medida pelo CAN (consumo aparente nacional), exibiu redução de 7,9% em agosto de 2023, sobre o mês anterior, e ficou 15,0% abaixo da de agosto de 2022.
Além do aumento da participação do produto importado sobre a demanda, preocupa o recuo da demanda final por produtos químicos, pelo segundo ano consecutivo, uma vez que reflete que o cliente da química também está sofrendo com a possível importação de bens e produtos de uso final.
No que se refere ao índice de preços, o segmento teve deflação nominal de 2,51% no mês de agosto, após queda de 6,64% em julho de 2023. Os preços no mercado doméstico têm acompanhado a forte pressão do cenário internacional. A economia mundial passa por um período conturbado e de forte instabilidade, sobretudo em decorrência da guerra entre Rússia e Ucrânia, agravado recentemente pelo conflito em Israel. Os preços dos energéticos em geral (óleo, gás e eletricidade), que subiram muito em meados do ano passado, não retornaram aos níveis pré-crise russa, mas já ensejam novas altas em razão dos acontecimentos mais recentes. Por outro lado, a demanda agregada mundial está estagnada.
Segundo Fátima Giovanna Coviello Ferreira, diretora de Economia e Estatística da Abiquim, cada país responde à sua maneira nesse cenário negativo. “Alguns apresentam políticas agressivas para estimular a economia interna; outros adotam restrições e barreiras à entrada de importações, visando proteger o seu mercado doméstico; outros, ainda, como o Brasil, sofrem com importações desleais de países da Ásia, que não aplicaram embargos às exportações da Rússia e conseguiram fechar negócios vantajosos em termos de compra de óleo e de gás.”
As perspectivas, continua Coviello, não são animadoras quando se leva em conta a aproximação do inverno no hemisfério norte, que deve afetar sobretudo o mercado europeu com custos altos dos energéticos. “Os preços do gás no Brasil antes do conflito representavam três vezes o valor do henry-hub americano, mas esses valores estão sendo pressionados e atualmente a diferença é bem maior (no Brasil cerca de 16/MMBTU, contra US$ 3,0/MMBTU nos Estados Unidos)”, afirmou.
Dentro desse cenário preocupante, vale destacar o aumento da participação do produto importado sobre a demanda local, que alcançou 45% nos primeiros oito meses de 2023. Esse aumento relativo significa uma perda de dois pontos percentuais na participação de mercado para o produtor local. O índice de utilização da capacidade instalada ficou em 65% na média entre janeiro e agosto de 2023, seis pontos abaixo do patamar de igual período do ano passado e atingiu o nível mais baixo da série desde 2007. De janeiro a agosto de 2023, o IGP Preços acumula variação negativa de 17,25%.
“A alta ociosidade do uso da capacidade produtiva mostra que a indústria local tem condições de elevar a produção no curto prazo, sem necessidade de novos investimentos. Por outro lado, o resultado da manutenção desse quadro difícil e desafiador pode ser o fechamento de plantas do setor químico, como, aliás, vem acontecendo nos últimos 30 anos”, finaliza Coviello.
Nesse cenário, a ABIQUIM entregou ao MDIC no período de julho a setembro uma agenda com medidas que buscam a manutenção de empregos, viabilizando a retomada da produção nacional de químicos e mitigando o atual surto de importações. Ao mesmo tempo, que traga soluções para atrair investimentos produtivos com base nas oportunidades de demanda e nas vantagens comparativas do Brasil, alavancando a geração de valor para a sociedade via desenvolvimento de municípios e estados, estimulando a economia do país. Nesse sentido, o gás natural deve ser um protagonista, e o Programa Gás para Empregar, lançado no primeiro semestre, é um passo bem-vindo, ao olhar para os atuais volumes reinjetados no pré-sal.
Déficit em produtos químicos é de US$ 35,8 bilhões no acumulado do ano
Desde os primeiros meses de 2023, as quantidades físicas de importações de produtos químicos têm aumentado consistentemente, superiores a 5 milhões de toneladas nos últimos três meses, em um contexto alarmante de surtos de aquisições predatórias e desleais, sobretudo originárias de países asiáticos e alicerçadas em competitividade artificialmente sustentada em razão da guerra no leste europeu, ameaçando fabricações brasileiras de produtos químicos estratégicos para várias cadeias de valor.
No acumulado do ano, até setembro, foram registrados expressivos aumentos nos volumes de importações de plastificantes (76,6%), de resinas termoplásticas (18%), de produtos petroquímicos básicos (12,3%), de intermediários químicos para detergentes (6,7%), entre outros produtos químicos diversos para uso industrial (14,4%), realizadas a preços predatórios e que estão desequilibrando o mercado interno (patamar mais baixo em produção e vendas dos últimos 17 anos, a um nível médio de ociosidade de quase 35% no uso da capacidade instalada no País, patamar excessivamente elevado).
As exportações brasileiras de produtos químicos, por sua vez, têm permanecido estáveis, em níveis mensais bastante inferiores ao das importações, com vendas médias de US$ 1,3 bilhão, relativas às expedições de 1,2 milhão de toneladas aos países de destino das mercadorias nacionais, resultado que vem seguidamente se agravando no contexto das dificuldades econômicas cambiais da Argentina, individualmente principal mercado de destino dos produtos químicos brasileiros.
A balança comercial de produtos químicos, entre janeiro e setembro de 2023, apontou um déficit de US$ 35,8 bilhões (superior aos registros de todos os anos anteriores, excetuados os recordes de US$ 64 bilhões em 2022 e de US$ 46,2 bilhões em 2021), resultado da diferença entre as importações de US$ 46,7 bilhões e das exportações de US$ 10,9 bilhões. Para o consolidado deste ano, prevê-se um déficit de até US$ 48 bilhões.
Para a Diretora de Economia e Estatística da Abiquim, Fátima Giovanna Coviello Ferreira, o agravamento das tensões geopolíticas internacionais está na base de um anômalo e intenso surto de importações de produtos químicos vindos de países asiáticos com competitividade artificialmente sustentada em insumos (gás natural e energia) e matérias-primas russas adquiridos por tais países com preços favorecidos em razão da guerra no leste europeu, deslocando os produtos fabricados no Brasil no próprio mercado interno e nos seus principais parceiros comerciais. Hoje, a China é o principal destino de exportações de óleo e gás da Rússia.
“A superação do particularmente crítico momento para o setor depende de um conjunto de ações pragmáticas e de alto impacto no curto prazo quanto ao acesso às matérias-primas e insumos energéticos em condições equivalentes àquelas dos principais players mundiais. Essas ações devem ainda ser combinadas com as políticas prioritárias na agenda de comércio exterior, de encerramento imediato da redução de 10% na alíquota do imposto de importação de produtos químicos, aplicada unilateralmente pelo Brasil, e de efetivação de uma Lista de Elevações Transitórias à Tarifa Externa Comum do Mercosul, que contemple os produtos químicos que mais sofreram com um surto predatório de aumento de mais 60% no volume das suas importações, com reduções de preços superiores a 30%, em um movimento totalmente atípico em relação aos outros mercados de origem”, destaca Fátima Giovanna.