Borracha  14/10/2025 | Por: Redação/ABTB

Borracha

Cooperativas no Acre extraem borracha com modelo sustentável

Extrativistas seguem critérios rigorosos de coleta e rastreabilidade para atender exigências de compradores


O Acre vem se consolidando como referência nacional em extrativismo sustentável da borracha, unindo tradição, inovação e geração de renda. No coração da floresta amazônica, famílias de seringueiros mantêm viva uma atividade centenária que hoje ganha força com o apoio de cooperativas, políticas públicas e empresas privadas comprometidas com a sustentabilidade.

A Cooperativa dos Produtores de Agricultura Familiar e Economia Solidária de Nova Cintra (Coopercintra), sediada em Rodrigues Alves, é um dos principais exemplos dessa transformação. A organização coordena o trabalho de 18 famílias que atuam na extração de látex nos municípios de Rodrigues Alves e Cruzeiro do Sul, integrando uma rede com pelo menos 26 cooperativas no estado.

A borracha coletada pelas comunidades é transportada pela Coopercintra até a Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Acre (Cooperacre), responsável por repassar o produto a empresas nacionais e internacionais. Entre elas está a marca francesa Veja, que utiliza de 20% a 40% de borracha amazônica nas solas de seus calçados – um exemplo de parceria entre desenvolvimento econômico e conservação ambiental.

Segundo a diretora executiva da Coopercintra, Queline Souza, o modelo adotado garante renda justa aos produtores e fortalece o ciclo sustentável. Ela explica que atualmente a cooperativa trabalha com 18 famílias de seringueiros em seis comunidades, que coletam o látex em suas próprias áreas e o entregam para pesagem e pagamento direto. Após o encerramento da safra, o material é enviado à Cooperacre, que faz a destinação final para a produção dos tênis da Veja.

O valor pago pelo quilo do CVP (borracha semiprocessada) chega a ser 3,5 vezes superior ao preço de mercado, alcançando até R$ 15 por quilo com os bônus de qualidade e de Serviços Socioambientais (PSES). As cooperativas também recebem um adicional de R$ 0,60 por quilo certificado pelo selo Fair for Life, destinado a investimentos em projetos comunitários.

Tradição e sustentabilidade caminham juntas

Entre os seringueiros que ajudam a manter viva essa tradição está Pedro Rodrigues de Souza, de 69 anos. Morador da zona rural de Cruzeiro do Sul, ele aprendeu o ofício com o pai ainda criança e hoje tem nas seringueiras sua principal fonte de renda. Segundo ele, a atividade extrativista foi essencial para sustentar a família e garantir um modo de vida em harmonia com a floresta.

Souza acredita que o equilíbrio entre exploração sustentável e preservação é fundamental para que a mata continue sendo fonte de vida e dignidade. Ele defende que é possível gerar renda a partir dos recursos da floresta sem recorrer ao desmatamento ou à queima, ressaltando que essa prática permitiu criar seus cinco filhos com independência financeira.

Tecnologia e capacitação impulsionam a qualidade da borracha

Para atender às exigências de qualidade da Veja e de outros compradores, os extrativistas seguem critérios rigorosos de coleta e rastreabilidade. Nesse processo, a Fundação de Tecnologia do Estado do Acre (Funtac) tem papel decisivo, oferecendo cursos e monitoramento técnico que elevam o padrão da borracha produzida.

De acordo com a diretora técnica da Funtac, Suelem Farias, a fundação iniciou capacitações voltadas à melhoria da coleta e do manuseio da matéria-prima, resultando em um produto mais limpo e com maior valor agregado. Ela reforça que o trabalho técnico e educativo tem sido essencial para fortalecer a competitividade da borracha acreana no mercado.

Políticas públicas fortalecem o extrativismo

O avanço do setor também é impulsionado por políticas públicas. Em junho, o governo do Acre implementou uma medida histórica ao efetuar o pagamento da subvenção do murmuru diretamente na conta dos extrativistas – um benefício aguardado há quase três décadas.

A nova metodologia, amparada pela Lei Estadual nº 1.277/1999 e pelo Decreto nº 1.564/2024, foi determinada pelo governador Gladson Cameli e executada pela Secretaria de Estado de Agricultura (Seagri). O secretário de Agricultura, José Luis Tchê, destacou que a criação de uma divisão exclusiva para o subsídio aos extrativistas e a parceria com o Banco do Brasil trouxeram mais agilidade e segurança ao processo. Ele informou que mais de 70 extrativistas já receberam o benefício diretamente em conta, e que o formato será mantido nas próximas etapas do projeto.

O modelo de extrativismo sustentável da borracha no Acre demonstra que é possível conciliar desenvolvimento econômico, valorização do trabalho local e preservação ambiental. A experiência das cooperativas e o apoio de instituições públicas e privadas reforçam o papel da Amazônia como exemplo de inovação e sustentabilidade na cadeia da borracha.